Prisão x educação
Um dos argumentos dos deputados para reduzir a idade penal sustenta que um jovem infrator de 17 anos já tem consciência dos atos que comete, já que a diferença de idade do criminoso que responde por todos os seus atos conforme o Código Penal e a do jovem infrator pode nem chegar a um ano.
Mas um adolescente estaria psicologicamente apto a responder por seus crimes como um adulto? "Se o adolescente pode cometer uma infração, ele também deve responder por seus atos. Assim como ele tem os seus direitos, também deve ter suas responsabilidades", afirma a psicanalista e professora da Associação de Psicanálise de Curitiba Lúcia Cavalcanti.
"Mas a questão que realmente deve ser discutida é: será que a prisão pode reeducar esse sujeito para a coletividade se ele já não respeita a lei?", continua a professora. "Claro que não", ela mesma responde. "Ele já deveria estar capacitado a reconhecer e aceitar as normas da sociedade. Se cometer um crime, é porque isso não aconteceu. Colocá-lo numa prisão não vai ajudar a educá-lo, assim como também não ajuda alguém mais velho".
Para Lúcia, a sociedade deveria pensar em processos educativos que começassem bem antes. Além disso, os dispositivos pedagógicos e sociais deveriam ser repensados para que o sujeito pudesse exercer plenamente seus direitos e seu convívio social. "A educação tem que começar desde o berço", afirma.
Lúcia acredita que o que faltou para os garotos do caso do índio pataxó foi educação para saber aceitar o próximo. "Da mesma maneira como alguns jovens quebram telefones públicos ou fazem pichações, eles encaravam o índio como uma placa a ser pichada. A reclusão não recuperaria o adolescente, nem vai recuperar os outros que foram presos. A reclusão não vai dizer a eles o que é certo e errado".
Mário Volpi tem opinião parecida: "A prática de um delito acaba desestruturando todo o caráter e a personalidade do adolescente. Não adianta pensar que se vai reconstruir esse caráter simplesmente impondo um castigo. É um trabalho terapêutico que demanda muito tempo. É preciso que o adolescente tenha a oportunidade de reorganizar sua vida".
A psicanalista acredita que, do jeito que as coisas estão hoje, não
adianta reduzir a pena, pois os jovens teriam que ser preparados para a realidade
dessa nova lei para serem capazes de responder por ela. "Primeiro, deve
vir o conhecimento". Ela conta o exemplo de uma escola pública em que as
crianças não iam para a sala de aula após soar o sinal do recreio. Por causa
disso, a diretora resolveu fazer uma sanção para aqueles que não obedecessem
às regras, que consistia na limpeza dos banheiros depois da aula para os alunos
que permanecessem no pátio. A diretora considerou a solução adequada, pois os
alunos teriam que fazer um trabalho que iria se transformar num benefício à
coletividade. Mas, no dia em que as mães souberam que os filhos ficaram limpando
o banheiro, mobilizaram a imprensa e foi aquele alarido na porta da escola,
o que fez a diretora ter de explicar por que tomou tal atitude, pois, segundo
as mães, "as crianças não estavam lá para limpar banheiro". "Os pais dessas
crianças infratoras desautorizaram a diretora, que não teve opção senão deixar
que sua escola virasse uma bagunça", explica Lúcia.
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